Viva a República protegida pela Monarquia






The Return Of The Giant Hogweed (1971)
Em face da estética republicana centrada numa mulher desnudada e carenciada de banho, com um seio à amostra numa época em que não existia cura para a tuberculose, tudo a necessitar de um "Manto Real" protector, sempre me meteu mais “respeito” uma mulher munida de um taco (não instrumentalizada e sem receio nem de "gigantes" nórdicos nem de "papões" latinos), vinda de outras latitudes onde a Monarquia Republicana ou a República Coroada é uma realidade intrínseca, obvia, abrange e não fracturante.

O caminho indicado não é derrubar a República, é fazer a Monarquia
PAIVA COUCEIRO (em 1921)

O adjectivo republicano pode caber-nos, na verdade, desde que lhe precisemos o sentido. Nos homens bons era forçoso reconhecer uma inegável independência republicana, aliada a uma inteira fidelidade monárquica.
ANTÓNIO SARDINHA (1887/1925)

A questão política, tal como tem sido posta, nos termos fratricidas monárquicos contra republicanos, republicanos contra monárquicos, não pode conduzir a nenhuma solução nacional,
Republicanos e monárquicos, monárquicos e republicanos-é necessário compreendê-lo e afirmá-lo!-nada existe, do que aparentemente nos separa tão importante como o que verdadeiramente nos aproxima: o mesmo acrisolado interesse pela Coisa Pública, conscientes de que praticamos um dever cívico, e a primazia que nesse sentido concordamos em dar à Política. Com a massa descolorada dos indiferentes, dos políticos, é que, nem uns, nem outros, temos afinidades.
Lamentavelmente temos vivido demasiado sob o império injusto de certas palavras fetiches.
MÁRIO SARAIVA (em 1970)



O presente post é realizado num quadro de descontextualização dos paradigmas que dominam a vida política e cultural portuguesa. Nunca me identifiquei com a dialéctica republicana e monárquica por me parecer que os conceitos são orgânicos. Têm sentido, precisamente, por estabelecerem laços continuados entre si, que é inevitável que eles se empobrecem e se anulam quando se confrontam. Quando são interpretados, isoladamente, no funeral do outro, frequentemente surgido pelo assassinato de uma das partes (um dos desportos favoritos dos republicanos castrados de monarquia é assassinarem membros de famílias régias), a demagogia primária instala-se. Sempre me pareceu o militante republicano e monárquico um minimalista que investe intelectualmente na solidão.


Para tomar um pouco de fôlego, em termos de filosofia política, fui aos meus arquivos para compensar a enxurrada de disparates que se têm ouvido neste centenário. Com coragem, em plena ditadura republicana, quando ainda se sentiam os reflexos das grandes transformações impostas pelos movimentos saídos de “Maio de 1968”, que uns privatizaram ou nacionalizaram como tendo a legitimidade de os representar, com a oportunidade intemporal rara de elaborar um manifesto que se mantém em 2010 com plena actualidade, um grupo de jovens monárquicos que nunca se identificaram como anti/republicanos punham o problema com a clareza que ainda hoje é perene volvidos, repito, 41 anos (1969/2010): (1) “Não ignoram os signatários que, para muitos portugueses, parece totalmente indiferente que o Chefe de Estado seja um Rei ou um Presidente e que, para outros, a hereditariedade do Poder supremo contraria o princípio absoluto da igualdade de direitos. Mas é exactamente para defesa da igualdade de todos os homens quanto aos direitos fundamentais, que importa garantir a existência de uma função bem diferenciada.
Colocado perante a urgência de uma reforma social e política verdadeira e integral, mas também justa e respeitadora das pessoas e das comunidades, o País há-de um dia concluir que é impossível realizar toda essa reforma de um modo habitual, harmónico e progressivo, sem rever a forma superior do Estado. Para não se reformar por um lado e deformar por outro; para não tornar a acontecer, como lei fatal, que a procura da liberdade gere a demagogia e a defesa da ordem gere a ditadura-a Nação Portuguesa há-de chamar o Rei”.


Sempre me considerei simultaneamente republicano e monárquico, parecendo tão evidente que estes conceitos podem acasalar que se não fosse a claustrofobia em que me sinto, neste centenário de uma República viúva de uma Monarquia que a acompanhou durante cerca de 800 anos, não perderia um segundo, não hipotecava um neurónio para falar deste assunto. Mas infelizmente, vendo republicanos que não sendo monárquicos defendem a República, e monárquicos que repudiando a República tomam calor a defender a Monarquia, sinto-me obrigado filosoficamente e politológicamente a dizer “umas coisas” em prol da minha consciência e sanidade mental.
Historicamente República e Monarquia sempre foram conceitos irmanados que só existem e têm operacionalidade política em conjunto. (2) "Antes da divisão fraticida-monárquicos e republicanos-quando a unidade nacional não precisava de ser invocada por tão natural que era, a Realeza conciliava-se com a República, mais exactamente, o Rei completava a República, fazia parte dela. Assim o Padre António Vieira dizia «um Rei muito republico".
Um verdadeiro republicano é necessariamente um monárquico. A procura de uma vivência republicana aponta para a necessidade da existência de uma realeza, única garante de imparcialidade, representativa da totalidade da população e vector de continuidade histórica, exercendo a magistratura da igualdade na governação. Assim, dissociar a Monarquia da República ou a República da Monarquia é um absurdo. O natural é procurar uma harmonia na qual se pode aplicar a designação de o Governo da República pelo Rei (3) " É este o título de um livro antigo escrito em 1496 por Diogo Lopes Rebelo, que fora mestre do jovem Duque de Beja, depois D. Manuel I. Pouco importa se é agora já inútil o que se dizem as suas velhas páginas. O que nos diz e sugere o seu título, isso sim, tem luminosa actualidade e flagrante oportunidade. "Não duvidamos de que bem mais do que na era de Quatrocentos. Então a República portuguesa tinha um Rei e conhecia o apogeu da sua grandeza. Hoje o Estado Republicano não é sinónimo de República. Falta-lhe o Rei".
Por estas razões o observador que aqui se encontra a reflectir só é monárquico porque é republicano, é o seu republicanismo que o conduz ao papel da Realeza (4)"a verdade-não é nenhum paradoxo!-é que pela Realeza melhor se defendem e conservam as Repúblicas. E veja-se se não é assim. Todos os Reinos europeus servem de exemplo, sem excepção. Só essas Repúblicas, tendo na suprema magistratura um Rei, conseguem manter, neste mundo oprimido e revolto dos nossos dias, a espontânea harmonia da autoridade e da liberdade; só esses Reinos conseguem ser verdadeiras Repúblicas". Com grande sentido de observação politológica Gonçalo Ribeiro Telles habituou-nos a resumir, repetidamente, este problema dizendo que “a melhor das Repúblicas é a Monarquia”.
Quanto mais avança o aperfeiçoamento institucional das liberdades republicanas mais necessária tornam a presença da instituição Real. A diferença, o antagonismo, a rivalidade, a concorrência apontam para a necessidade de uma instituição reguladora e equidistante (5) "por isso, o Rei, representa o todo, não pode ser uma parte. Nem tomar partido naquilo que represente ser por uns contra os outros, enquanto todos são ele e ele é para todos. E é assim porque só quem representa o todo pode estar acima e compreender uma parte deste".
A condução da República, a sua governação e administração conjuntural, legitima resposta ás necessidades imediatas, opináveis e onde impera a diversidade ideológica servida por protagonistas diversificados que coexistem em circulos eleitorais com vencedores e vencidos,só sobrevive com a Monarquia. A governação republicana corrente, carregada naturalmente por conflitualidade, necessita de sedimentar-se na continuidade da Magistratura Régia pacificadora (6) “ORei não administra. Não é um simples governante. É o primeiro servidor da Grei. Não foi eleito porque ainda é e sempre continuará a ser o que já foi. Só se elege o que ainda pode vir a ser de entre todas as hipóteses que podiam ter sido e não foram nem serão. Não o que é porque é. O Rei não concorre contra ninguém, portanto não está contra alguém".


Os portugueses pressentem que a desagregação continua do Estado exclusivamente republicano, instituído em 1910, está em decomposição acelerada, não responde aos presentes desafios: (7) “Num processo tão vasto de globalização e de integração, são os conceitos em que assenta o próprio Estado que estão hoje em causa. O povo vê sublimada a relevância dos restantes elementos que compõem o Estado. O território e a própria soberania perderam crescentemente importância em consequência não só da globalização, mas também da alucinante evolução tecnológica e, em especial das novas tecnologias de comunicação. É por isso imperioso que as nações consigam encontrar novos elementos de agregação da sua identidade sociocultural e é aqui que vale a pena enfatizar a relevância e modernidade da Instituição Real. Um Rei não vale, nas sociedades modernas, apenas pela sua especial isenção e supra partidarismo, somente pela continuidade, preparação e experiência que imprime ao exercício das suas funções, vale hoje de forma muito especial pelo papel que pode assumir ao nível da coesão nacional e, principalmente, como referencial histórico, cultural e efectivo na Nação. O tal novo elemento de agregação como um efeito claramente compensador das perdas inevitáveis de soberania que sobram dos processos de globalização”.
O Estado estando em crise transforma a Nação na única entidade comunitária que pode ser mantida, recuperada e reforçada. É óbvio que a Instituição Real, neste particular, é inultrapassável na capacidade de agregar uma nacionalidade que, no limite, nem necessita de Estado. (8) "Hoje o conceito de Estado está a evoluir e com ele o da sua chefia. Com o avançar do processo de integração europeia, tornar-se-á cada vez mais difícil precisar as funções do Chefe de Estado. Supremo Magistrado de um sistema jurídico que se rege por normas de direito comunitário e integra tribunais supranacionais? Comandante em Chefe de forças Armadas que participam em exércitos multinacionais? Quer se seja a favor ou contra, esta evolução é uma realidade (...)".

A grande missão dos portugueses, no Século XXI, não consiste na abolição da República mas, antes, no enriquecimento do republicanismo com a Monarquia. É o regime Monárquico que irá permitir o convívio republicano. O importante é que a República portuguesa se abra à Monarquia: (9) “para que a Democracia se aperfeiçoe e se aprofunde, servindo não só a maioria e a maioria eventual própria do sistema de alternância, mas na realidade servindo todos os grupos legítimos, todas as minorias, é urgente que a República Portuguesa se abra à Monarquia”.
Não se pode ficar indiferente aos apelos dos que têm servido Portugal na legitimidade, mesmo que legalmente o que resta do Estado português não lhe reconheça oficialmente tal tarefa (10) “Sejam quais forem as circunstâncias, tais deveres não prescrevem pois constituem a justificação essencial do Princípio que represento. A Instituição Real explica-se por uma dádiva total ao País, para além da existência ou não do Trono. Os Reis e os seus Herdeiros nascem para servir a colectividade e para amá-la, reinando ou não, em mandato natural que não cessa de obrigá-los e, todavia, deve afastá-los da competição pelo Poder. Atentos à vontade do Povo, livremente expressa, poderá caber-lhes reinar mais jamais disputar, explicam-se para unir, no Trono ou na vida mais discreta, no devotamente público ou na dedicação mais silenciosa. Se desta forma procederem, serão sempre coerentes à Realeza que detêm, independentemente do respectivo exercício".

Viva a República, venha a Realeza que a defenda.

(1) Manifesto da Renovação Portuguesa realizado em Maio de 1969.
(2) SARAIVA, Mário (1970) Razões Reais, ed. qp, Lisboa, , p. 127.
(3) SARAIVA, Mário (1970) Razões Reais, ed. qp, Lisboa, p. 130.
(4) SARAIVA, Mário (1970) Razões Reais, ed. qp, Lisboa, , p. 129.
(5) TEIXEIRA PINTO, Paulo - Ideal Real, Por uma Causa, Boletim da Real Associação do Algarve, Maio de 2000, Nº3, p. 6.
(6) TEIXEIRA PINTO, Paulo - Ideal Real, Por uma Causa, Boletim da Real Associação do Algarve, Maio de 2000, Nº3, p. 6.
(7) SOUSA-CARDOSO, António - Discurso de Encerramento do IX Congresso da Causa Real, Braga, 2002, P 12.
(8)CYMBRON, Pedro-Jornal o SEMANÁRIO, ano XVIII nº900, de 16 de Fevereiro de 2001,pág. 9.
(9) Comunicação proferida por Dom Duarte Pio ao povo português no 1 de Dezembro de 1998.
(10)Comunicação de Dom Duarte Pio de Bragança ao povo português no mês de Março de 1977.
Nota-Esta 1ª Mensagem de Sua Alteza Real (SAR) o Senhor Duque de Bragança intitulada “Ao Povo Português. Aos povos dos Novos Países de Expressão Portuguesa. Às Comunidades de Raiz Lusa no Mundo Inteiro”, tem a importância de ter sido a primeira vez em que Dom Duarte Pio se assumiu como sucessor ao trono de seu Pai: “encontrei-me investido na Chefia da Casa de Bragança, na Representação do Princípio Monárquico, sobre o qual a Nação Portuguesa se organizou, consolidou e desenvolveu, projectando no Mundo benefícios e valores indiscutíveis”.