Crise. Qual crise?


Supertramp - Soapbox opera; album Crisis? What Crisis? (1975)



Ver debates entre putativos primeiros-ministros oriundos do bloco central só com a companhia do filósofo Daniel Innerarity. Aprisionados a executar programas que já não são matéria da sua decisão, limitados a apresentarem resultados sobre orientação, a encenação em torno da liberdade de escolha torna-se patética: "quanto menos há para decidir, quanto menos está em jogo, tanto mais se faz notar a qualidade da representação".

O ponto de partida da maioria da assistência que preside a este tipo de espectáculos conduz-se pelo estereótipo que os artistas não são sérios. A aparência é soberana. O que aparentar ser menos mentiroso, um pouco mais económico nas contradições e um nadinha contido na demagogia triunfa. "Assim sendo, vence aquele que melhor sabe representar a credibilidade. Por isso a lógica dos meios de comunicação exige a personalização da política, a continua vinculação de notícias mais ou menos abstractas a nomes e, se possível, a rostos".

A campanha vai avançando. A possibilidade de agir politicamente de forma diferente e livre é ténue. Sobra personalizar os problemas para parecer que existem clivagens. "Os comportamentos e os temas só suscitam interesse quando as pessoas vêm neles assuntos pessoais. Na contenda eleitoral já não se enfrentam programas, mas rostos, sem um rosto visível nem, sequer as melhores ideias politicas se podem fazer notar".

Esperando a Troika



Genesis Firth Of Fifth (Selling England by the Pound) 1973


Tendo, por mais de uma vez, achado de grande pessimismo e radicalismo muitas das posições deste autor, não encontro melhor forma de descrever o que se passa na III República que num dos seus textos. Tanto mais que tendo sido escrito em 1985 ganha uma intemporalidade notável.

"Nunca é demais denunciar que a economia portuguesa está em crise porque Portugal está em crise.
Tornou-se o Estado português como um grande «diner-buffet», onde os gulosos satisfazem a voracidade; mas, como qualquer «diner-buffet», desaparece rapidamente quando não há quem sirva com ordem e preceito e confeccione arduamente ao ritmo da voracidade.
E, no atropelo da corrida às vantagens individuais ou de grupo, criaram-se as tensões, o conflito, o isolamento. A convivência entre os portugueses está degrada e a competição exacerbada; imperam, como critérios de promoção socio-profissional, o compadrio, o sectarismo, a corrupção, a versatilidade de carácter.

A competitividade económica foi abafada pela competitividade política. A economia da capacidade concorrencial foi substituída pela economia da capacidade reivindicativa.

As análises, os diagnósticos e as terapêuticas sobre a economia portuguesa pululam. No ambiente em que se vive, são geralmente exercícios sectários ou expressões de circunstancialismos políticos".

Herlânder Duarte
Economia de Bem Comum (1985)

Foi beatificado João Paulo II no dia do trabalhador. Sobre o papel do trabalho na realização humana, a problemática filosófica do que andamos a produzir, para quê e com que efeitos? ou sobre os limites evidentes do liberalismo e do socialismo para resolver os problemas humanos foi, de todo, "milagroso" nas contribuições que nos deixou.

" O Homem de hoje parece estar sempre ameaçado por aquilo mesmo que produz. ... Nisto parece consistir o capítulo principal do drama da existência humana contemporânea, na sua dimensão mais ampla e universal. Consequentemente, o Homem vive cada vez mais no medo".

João Paulo II
Encíclica Redemptor Hominis (1979)